Leio novamente um texto que me salta aos olhos, em Habacuque 1.2-4
Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não me salvarás? Por que me mostras a iniquidade e me fazes ver a opressão? Pois a destruição e a violência estão diante de mim; há contendas, e o litígio se suscita. Por esta causa, a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta, porque o perverso cerca o justo, a justiça é torcida.
E fico perplexo… como sempre.
A pressão e a opressão que impregna o mundo feminino é algo inimaginável para mim, como homem. Posso observar, tentar ter empatia, simpatia e antipatia dos que provocam os males, mas, falando sinceramente, minha pele não dói como a de uma mulher, por isso, posso somente falar do que observo – de uma observação participante, como pesquisador, teólogo e estudioso destes meandros mesquinhos da alma humana.
O caso recente da Mariana Ferreira Borges (Mariana Ferrer) que repercute e coloca em cena a violência e os violentos, bem como os que sofrem a violência é algo estarrecedor. As cenas do vídeo divulgado (vi o vídeo na íntegra) são muito esclarecedoras de como funciona o mundo masculino e feminino e isso me dá calafrios – sempre!
A violência contra as mulheres é algo muito sério para ser tratado de qualquer jeito. A tensão aí é do poder, é fálica. É a tensão do quem pode grita mais alto e faz valer o seu direito na marra.
A violência, seja ela como for, praticada por homens com mulheres sempre será uma tentativa de controle; o homem quer controlar o objeto que está à sua frente, afinal, ela foi “feita” para servir a ele e deve então “prostrar-se” diante da sua majestade o “rei-homem”.
Vivi grande parte da minha vida num contexto em que um homem (meu pai) tratava uma mulher (minha mãe) com respeito e consideração. Ele não entendia (e isso era bem claro para mim quando ouvia como ele falava com e sobre ela e como ele tratava minha mãe) que ela era inferior ou superior a ele, mas igual.
Acho que, por isso, é tão difícil para mim ver e imaginar uma mulher sendo tratada como lixo, como um objeto, como alguém que é inferior e que pode ser descartada de qualquer maneira.
Em Gênesis 1.27 diz que Deus criou o homem e a mulher à sua imagem e semelhança – ou seja, iguais em sua essência e propósito diante dele. A imagem de Deus refletida na criação da mulher não é diferente da imagem de Deus refletida na criação do homem. Não há hierarquia ou posição dominante aí. As definições de servidão, dor, subjugação vem depois, com a queda, com o pecado. É o pecado que torna tudo turvo, tudo errado, tudo morto, tudo desgraçadamente torto.
A sexualidade, algo tão sublime, acaba por se tornar uma forma de subjugar, de atacar, de controlar, de destruir.
A violência contra a mulher não está apenas no quesito sexual, é muito, mas muito mesmo, mais abrangente: é uma violência psicológica; violência educacional; violência diante dos direitos e deveres; violência financeira; violência matrimonial; violência judicial; violência econômica; violência na saúde; violência na distribuição das riquezas e bens; é violência eclesiástica; é violência teológica … é violência por todos os lados com o profeta Habacuque diz.
Minha esposa me diz sempre que ela anda cansada de ter que ficar participando da “festa dos homens”, numa clara referência à esse nosso mundo machista e sexista que joga no lixo facilmente as condições mínimas de convivência social e moral pelo prazer e hedonismo, pelo poder e pelo dinheiro.
Você e eu podemos ajudar a mudar tudo isso ensinando, educando e formando pessoas que respeitem as mulheres não apenas socialmente, mas sobretudo que tenho uma atitude de respeito para com o ser humano feminino lutando contra o mal que está dentro de cada um de nós (nossa carne pede pelo pecado!), mas não somente isso, podemos fazer mais: podemos mudar também nossa maneira de ser, de falar, de tratar, de considerar, de não se importar. É necessário ter não somente uma atitude não negativa, mas uma atitude positiva, que empreenda novas formas de pensar em nossa família, em nosso grupo social, em todas as mídias que acessamos, em qualquer contexto em que estamos inseridos.
Nós fomos chamados para a transformação – não somente da nossa conduta espiritual, mas na nossa vida como um todo, envolvendo tudo o que somos, pensamos, fazemos e sonhamos. Quando Paulo nos exorta que devemos transformar nossa mente para que tudo o que esteja em nós agrade a Deus ele não está falando apenas de uma conversão espiritual que nos levará ao êxtase no louvor e adoração dentro de nossos templos ou ações religiosas, mas ele estava pensando, principalmente, na parte prática da vida e do dia a dia. A transformação que é apenas religiosa não é transformação, mas sim, hipocrisia.
É necessário repudiar o mal, mas não apenas ficar no repúdio moralista nas redes sociais. É preciso colocar a mão no arado e ajudar a construir uma situação familiar, social, religiosa e humana melhor.
A espiritualidade deve ser vivida como uma cruz, onde a parte vertical da intimidade e amor com Deus cruz com a parte horizontal da intimidade e amor para com o outro. Sem isso, incorremos em sermos tidos como mentirosos e falsos cristãos.
Que Deus nos ajude!